“A fortuna que o homem deixa é o que ele lega para a humanidade. O que os meus netos diriam se eu viessem aqui e me vissem destruindo, plantando café, ganhando dinheiro? O dinheiro não é tudo na vida e o homem precisa entender isso”, disse o produtor.
Produtor rural Gilson Mansur recuperou área devastada e transformou em paraíso ambiental em Santa Teresa, no Espírito Santo. — Foto: Reprodução/TV Gazeta
De acordo com Gilson, a propriedade era desertificada, arenosa e estava totalmente devastada por causa de uma plantação de café quando foi adquirida. Também não havia água, o que, segundo o produtor, tornaria inviável qualquer plantação em pouco tempo.
Foi diante deste cenário que o produtor deixou de lado a aspiração de ser referência na plantação de café no Espírito Santo, estado com a maior produção da variedade conilon, para preservar o meio ambiente. A primeira ação foi justamente fechar uma estrada que passavam carros para recuperar a Mata Atlântica.
Propriedade de Gilson Mansur, em Santa Teresa, na Região Serrana do Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta
Hoje o cenário é outro. Animais e árvores típicos da Mata Atlântica, como jaguatirica, macaco-bugio e marreco silvestres voltaram a habitar a propriedade. Além disso, nascentes que alimentam o Rio Bonito, Rio Timbuí e Rio Fundão foram recuperadas.
”Eu não tô plantando pra mim, eu tô plantando pra eles. Somente daqui a 50 anos essa floresta vai estar com água perenizada. Então, eu sei que não vou ver, mas é um trabalho que a gente tem que legar para as futuras gerações”, disse o produtor.
Nascentes foram recuperadas em propriedade de Santa Teresa, na Região Serrana do Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta
Caçadores de água
Na aspiração de recuperar a mata nativa e as nascentes da propriedade, Gilson encontrou o apoio de alguns amigos nas décadas de 1980 e 1990, quando pouco se falava de consciência ambiental. Um deles foi o engenheiro agrônomo Fabrício Fardim, que trabalhava no Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo (Idaf).
Grupo ‘Caçadores de Água’ realiza trabalha em prol da preservação ambiental em Santa Teresa, na Região Serrana do Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta
De acordo com o engenheiro, bastava reflorestar a propriedade para que as nascentes que alimentavam o Rio Bonito e o Rio Timbuí, até então secas, voltassem a ter vida.
“Eu lembro que, na época, até para o Gilson conseguir fazer o projeto e conseguir mudas também de espécies nativas da Mata Atlântica teve um pouco de dificuldade. Mas ele persistiu e conseguiu recuperar a Mata Atlântica aqui na propriedade dele”, destacou.
Primeira nascente demorou 20 anos para ser recuperada
Gilson teve que exercitar a paciência para reflorestar a área devastada. Após 20 anos de cuidados com a propriedade, a primeira nascente foi recuperada. No local, os dois fizeram uma oração quando viram a água pela primeira vez.
“Rezamos, agradecemos e graças a Deus a água só está aumentando”, comemorou o produtor.
Primeira nascente recuperada na propriedade de Gilson Mansur, em Santa Teresa, na Região Serrana do Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta
O cuidado não parou. Gilson canalizou as nascentes, fazendo com que o curso da água seguisse até o Rio Bonito, um dos afluentes do Rio Santa Maria, que, por sua vez, nasce em Santa Maria de Jetibá e abastece mais da metade da Grande Vitória (veja mapa abaixo).
Rio Bonito, um dos afluentes do Rio Santa Maria, que nasce em Santa Maria de Jetibá e abastece a Grande Vitória, no Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta
Exemplo se torna inspiração
A dedicação do produtor rural, que começou sozinho, influenciou outras pessoas positivamente. Gilson se tornou exemplo para um grupo de voluntários intitulado ‘Caçadores de Água’, qual trabalha de forma a combater o desmatamento.
Promotora do grupo, Vera Murta afirmou que os ‘caçadores’ utiliza o exemplo do produtor para inspirar outras pessoas.
Produtor Gilson Mansur teve dificuldade para conseguir mudas de plantas nativas da Mata Atlântica. Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta
“A gente leva [este exemplo] para as palestras, onde falamos com infratores sobre meio ambiente. É uma forma de levar o modelo, o exemplo, então acrescenta muito”.
Outra participante do Caçadores de Água é o frei Anderson Teodoro, responsável pela pastoral universitária da região. Em parceria com o produtor, ele já plantou 500 mudas com os alunos da região.
Frei é um dos entusiastas da preservação ambiental na propriedade de Gilson Mansur, em Santa Teresa, no Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta
“Como é que eu vou amar o próximo e deixar um planeta sujo? Como é que eu vou amar o próximo e deixar um planeta poluído?”, refletiu o frei.
O religioso afirmou ainda que plantar não é só colocar uma árvore na terra, mas é você adquirir uma responsabilidade pelo planeta.
“Mas também não é só plantar e plantar. É descobrir como posso produzir menos lixo, como posso cuidar mais do planeta, como posso cuidar mais do ser humano ajudando na ecologia”, destacou.
Incentivo do governo
Mais de 7 mil mudas da propriedade de Gilson Mansur foram disponibilizadas pelo projeto Reflorestar do governo do Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta
Quando mais verde se tornava a propriedade de Gilson, mas água brotava das nascentes da propriedade e mais apoio era recebido de todas as formas, inclusive do governo do Espírito Santo.
Por meio do programa Reflorestar, iniciativa coordenada pela Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama) e que tem o Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes) como agente técnico-financeiro, mais de 7 mil mudas de espécies nativas da Mata Atlântica foram plantadas na propriedade.
De acordo com o engenheiro agrônomo Fabrício Fardim, o produtor concentrou esforços na recuperação da mata ciliar, vegetação presente em espaços próximos a corpos da água para proteger as nascentes.
“Essa mata ciliar tem essa função justamente de proteger a água. Quando chegar água nela, vai chegar filtrada. A erosão não vai romper ali porque áreas de preservação permanente. A gente tem que encontrar meios para que o solo da nossa propriedade absorva essa água. Para isso, a gente usou aqui meios de preservação de floresta, de restauração, de cobertura florestal…”, explicou o engenheiro.
Dificuldade para construir represas
Para economizar água, o produtor Gilson Mansur fez represas em sua propriedade, localizada em Santa Teresa, no Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta
Gilson logo percebeu que seria importante não desperdiçar nem pouco da água que aparecia no sítio. Mas, em torno dos anos 2000, o produtor teve dificuldade para conseguir licença para construir as represas.
De acordo com Fardim, em 2006, a legislação para construção de barragens era muito mais rígida do que hoje.
“Naquele momento, nós não pudemos emitir a licença para ele, que sempre procurou fazer o projeto. Logo depois, a lei mudou e a gente pôde emitir a licença ambiental para o seu Gilson Mansur”, destacou.
O engenheiro agrônomo Aliamar Cardoso foi quem fez o projeto das barragens, seguindo todas as normas de segurança.
Representa precisa seguir normas técnicas do CREA-ES — Foto: Reprodução/TV Gazeta
“Primeiro, o profissional que vai elaborar o projeto tem que ser registrado no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Espírito Santo (Crea-ES) . Assim, ele vai executar, acompanhar a obra do projeto, emitir as anotações de responsabilidade técnica para que você tenha segurança da obra e a maior quantidade de água possível. Isso a propriedade do Gilson tem”, destacou.
O engenheiro explicou ainda que o reflorestamento feito na propriedade de Santa Teresa, é responsável por fazer a recarga da caixa d’água do lençol freático.
“A água que bate aqui ela não escorre mais. A planta aproveita o que pode e o que conseguir vai alimentar o lençol freático, contribuindo para a barragem ficar perene o ano inteiro”, afirmou.
Fauna e flora diversificada
Mais de 100 espécies de frutas e pelo menos 20 animais da Mata Atlântica existem na propriedade de Gilson Mansur, em Santa Teresa, no Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta
De acordo com o produtor, a propriedade conta com mais de cem variedades de frutas e 20 espécies nativas da Mata Atlântica. Os animais – que não eram mais vistos – voltaram a aparecer.
“O quati, o macaco-bugio, a jaguatirica, a capivara, os marrecos silvestres… Esses animais não existiam mais aqui e voltaram a fazer o habitat neste lugar. Eles vêm, procriaram e vão embora”, disse o produtor.
O produtor destacou ainda que o paraíso ambiental conta com centenas de pássaros. “Você chega aqui na mata e é uma sinfonia”, comentou.
Mas o produtor também destacou que tem outra meta: ver um bicho-preguiça na propriedade.
“Temos aqui a árvore favorita do bicho-preguiça, se Deus quiser a preguiça vai voltar a habitar aqui”, brincou.
Árvore favotira do bicho-preguiça está a espera do morador na propriedade de Gilson Mansur, em Santa Teresa, no Espírito Santo — Foto: Reprodução/TV Gazeta
A árvore do bicho-preguiça é um embaúba, espécie pertence ao estrato das plantas pioneiras da Mata Atlântica. Na propriedade do Gilson, ela está à espera do morador.